domingo, abril 30, 2006

NEGOCIANDO COM A MORTE - conto

Daniel estava feliz por voltar para casa, até um trágico acidente poder fazê-lo perder o que mais ama, sua familia. Porém, ele fará de tudo para impedir isso, mas às vezes o destino nos prega peças, e isso ele descobrirá na Fuga Da Sanidade.

NEGOCIANDO COM A MORTE Por Rodrigo Carvalho®

Daniel estava muito feliz, pois finalmente voltava para sua família. Estava feliz, pois a menos de uma hora chegaria a sua casa e da janela do avião via as nuvens de sua terra natal dando-lhe boas vindas. Era onze da noite e faltava muito pouco para esse tão esperado reencontro. Mas infelizmente seu destino era outro. O avião em que estava sofreu uns problemas no motor e comprometeu a vida de várias pessoas. O piloto e o co-piloto faziam tudo que podiam enquanto as aeromoças tentavam acalmar os passageiros. Daniel rezava para aquele terror acabar logo e ele poder reencontrar sua esposa e filho. O pânico aumentava à medida que o avião caia. Daniel então viu a morte o chamando e sabia que não poderia escapar dela.
Os gritos cessaram quando o avião se chocou no chão a poucos quilômetros do aeroporto. Não houve sobreviventes. Daniel se via agora seguindo sozinho por uma estrada longa e deserta. Não havia nenhum sinal de vida ao redor. Dos dois lados só se via flores douradas e o céu era claro como uma bela manhã de domingo na antiga fazenda de sua família, onde passara os fins de semana junto com seus pais. Apesar do ambiente lhe agradar, se sentira sozinho e sabia que não mais veria sua família. Não, ele não podia aceitar. Não queria ficar só para sempre. O desespero tomara conta de sua mente e ele lamentara sua morte e já não queria mais seguir em frente.
“Ora, não fique assim, estar morto não significa o fim de tudo. É apenas o começo!”, disse uma voz familiar vinda do seu lado direito. Ao olhar, Daniel não conseguiu se conter ao rever seu pai que falecera quando ele ainda era criança. Seu pai sorriu e disse que ele deveria continuar seguindo. Daniel o ignorou e o abraçou de tanta felicidade. “Não fique tão animado, Daniel, não é bem o que você está pensando. Eu não sou seu pai, sou a Morte. Apenas vi com a aparência dele para conforta-lo.”, disse o homem. Daniel o largou espantado. “Não precisa ficar assim, para onde você vai encontrará seu pai!”, disse a Morte, “Apenas continue seguindo!”. “Não, não posso! Tenho que voltar para casa!”, gritou Daniel. “Olhe, sei como deve estar se sentindo, mas seu lugar agora é no fim deste caminho!”, disse a Morte novamente. “Mas eu preciso voltar! Meu filho só tem sete anos e minha esposa também precisa de mim!”, insistiu Daniel. “Eu sei, mas agora você está morto e eles vão ter que se contentar com isso.”, disse a Morte.
Daniel se ajoelhou aos pés da Morte e implorou: “Por favor, me mande de volta. Eu imploro!”. “Sinto muito, mas não posso fazer isso.”, lamentou a Morte. “Por favor, não quero ficar só! Não quero perder minha família!”, insistiu novamente Daniel. “Está bem... vou te mandar de volta se você me vencer em uma partida de xadrez”, propôs a Morte e Daniel aceitou sem questionar. Então ela fez aparecer uma mesa com duas cadeiras e um tabuleiro de xadrez com peças de ouro.
A partida foi longa e demorada. Daniel estava ficando com dor-de-cabeça de tanto pensar em uma estratégia melhor que a da sua adversária. Enquanto que a Morte apenas sorria e se divertia, pois já fazia um bom tempo que não encontrara alguém para jogar xadrez com ela, pelo menos alguém tão bom. O jogo se estendeu por mais algumas horas até que finalmente Daniel gritou “Xeque-mate!”. Talvez a Morte não tenha usado toda a sua habilidade e estivesse tentando ser uma adversária razoável para que Daniel pudesse ter uma chance de vencer. Bom isso já não importava mais porque o jogo havia acabado.
A Morte então se levantou e impressionada com a vitória do adversário disse, “Você venceu de maneira justa. Me impressionou, mas não ache que terá a mesma sorte da próxima. Já que lhe prometi mandar-lhe de volta, cumprirei com minha promessa. Você voltará e viverá até ficar bem velho, quando finalmente nos reencontraremos e, quem sabe poderemos jogar novamente sem apostar nada, só por diversão. Mas lembre-se você terá que viver muito e só voltará para cá com morte natural. Qualquer coisa diferente, sua alma ficará presa no Mundo dos Vivos por um bom tempo”. “Seria legal jogar com você novamente!”, disse Daniel sorrindo. A Morte então disse que ele deveria voltar com calma pelo caminho de onde veio e logo estaria de volta a sua vida. Daniel se despediu e fez exatamente o que ela disse, andando com bastante calma, mesmo querendo correr. Caminhou por mais algum tempo até que viu uma luz dourada a sua frente e a atravessou.
Acordou num hospital deitando em uma cama e rodeado de máquinas, enfermeiras e um médico tentando reanima-lo. O médico feliz por ter salvado mais uma vida, disse que ele esteve desacordado por mais de doze horas e que eles já estavam sem esperanças, pois todos os outros passageiros morreram. Foi, sem dúvida, um milagre.
Daniel estava louco para rever sua família. Mas o médico disse que ele deveria esperar mais um pouco lá que logo eles iriam visitá-lo. Logo depois que todos saíram, sua esposa e filho entraram na sala. Daniel não conseguiu conter a felicidade e quis se levantar, mas com um gesto de mão, sua esposa pediu para que ele permanecesse deitado. Foi então que percebeu que eles pareciam tristes. “O que houve?”, perguntou ele, “Não estão felizes por estar vivo?”. Sua esposa balançou a cabeça para os lados e lágrimas caíam de seus olhos. “Por que não?”, perguntou Daniel bastante confuso. A porta se abriu e o médico entrou. Seu rosto parecia triste, porém ele já estará muito acostumado com esse tipo de situação. “Aconteceu alguma coisa?”, perguntou Daniel. O médico então, da melhor maneira possível, disse que sua esposa e filho sofreram um acidente de carro quando iam ao aeroporto e morreram. “Mas isso não é possível! Eles estão aqui! Você não está vendo?!”, gritou Daniel. Ao olhar novamente para sua bela esposa e seu único filho, via-os ficarem transparentes e uma luz branca surgir atrás deles. Daniel não teve reação neste momento e desejou sofrer um enfarte para poder partir com a sua família, mas vinha a sua mente a Morte dizendo que ele ainda iria viver muito. Por mais que se matasse, ficaria preso na Terra. Daniel agora só pôde chorar e amaldiçoar sua vida que não tem mais sentido, pois está sozinho para sempre.

Um comentário:

paulo nazareno disse...

Ê rapaz, mas e o Forrest Whitaker? Não apareceu mesmo? :) Um abraço.